Cities: Skylines - às vezes não é preciso uma revolução, apenas evolução

Publicado originalmente no Medium em 12/04/2015

O velho SimCity 4 ainda é um bom jogo e uma excelente forma de fazer fãs de simulação como eu gastarem bastante tempo, mas a idade avançada (ele surgiu em 2003, em tempos de Windows XP, PlayStation 2 e celulares Nokia que resistem até a bombas de hidrogênio) deixou suas limitações cada vez mais visíveis. Principalmente nas ferramentas de mobilidade urbana, que sofrem com as raízes californianas da Maxis; a expansão Rush Hour é necessária pra elas sequer chegarem num nível aceitável. Sim, os fãs ajudaram muito com o Network Addon Mod, mas por limitações naturais do jogo ele não oferece nem de longe a experiência fluída das ferramentas padrão.

Por isso, quando a Maxis anunciou que, 10 anos depois, ele finalmente teria um sucessor, comemorou-se muito. Nem mesmo saber que o jogo seria 100% online era o suficiente para fazer os mais otimistas entre nós perderem a fé por completo. Estávamos acostumados com excelentes localizações, regiões amplas e lhamas, muitas lhamas; não tinha como dar errado.

"Como transformar um estúdio adorado por todos numa fonte de vergonha alheia sem fim: Parte II" (a I foi lançada pela Blizzard cerca de um ano antes)

Ops.

O fiasco do lançamento gerou insatisfação geral, uma enorme quebra de confiança e o pior: todos os canais de jogos do YouTube começaram a fazer piadas a respeito.

Que alternativa restava para esse público desapontado? Cities XL era o melhor candidato, mas têm problemas de desempenho catastróficos até hoje e os desenvolvedores apenas relançavam o mesmo jogo com mudanças pontuais há anos. Ser um fã de simuladores de cidades em 2013 abalava qualquer tipo de fé na indústria de jogos.

Até que, dois anos depois, surge um oponente.

Olar

Cities: Skylines não revoluciona, mas esse nem é o objetivo dele. Os conceitos básicos são os mesmos criados por Will Wright na década de 90: você tem zonas residenciais, comerciais e industriais com densidades diferentes, usinas de força de vários tipos, serviços públicos como escolas e bombeiros, construção de parques, etc. Porém, enquanto o último SimCity te restringe a cidades minúsculas conectadas 24 horas por dia com o objetivo de ser mais “social” (a grande buzzword da época), Skylines apenas te dá um lote de terra cortado por autoestradas e linhas de trem e  - isto é muito importante - expansível. O resto é refinamento.

As opções de construção são liberadas em pequenas mas constantes doses à medida em que a cidade cresce (pra garantir, em princípio, um desenvolvimento mais natural), as ruas são variadas, maleáveis e restringem explicitamente o zoneamento, as linhas de transporte público são fáceis de criar (graças à experiência adquirida com Cities in Motion) e é possível delimitar regiões distintas com políticas próprias. Não chega a ser uma experiência totalmente nova, mas é muito mais agradável. É como o surgimento da banda larga: você não precisa mais esperar até a meia-noite ou as 14h de sábado, nem ter que desconectar quando alguém da família quer usar o telefone.

Simuladores de cidades são famosos por ensinarem lições de planejamento urbano de forma natural, e Skylines faz isso muito bem. Crie quadras extensas com zoneamento de alta densidade e problemas de tráfego serão inevitáveis. Tente resolver isso apenas com ruas mais largas e rápidas e veja a desvalorização causada pela poluição sonora - isso se não houver aumento de tráfego porque carros de outras regiões preferem a nova rota!

De minha parte, queria presentear duas pessoas: o secretário de transportes de Porto Alegre e o secretário de obras.

E mesmo suas inevitáveis limitações podem ser contornadas de forma mais fácil: o suporte a mods e construções personalizadas é bastante amplo, permitindo até mesmo extensas mudanças na interface. A experiência vanilla já é bem agradável, então pode ser que você nem se lembre dessa extensibilidade.

Tudo isso com um time de 13 finlandeses desenvolvendo na Unity, a mesma engine usada como base para tantos desses jogos de terror malfeitos que existem por aí. A experiência com Cities in Motion deu a eles a confiança para um projeto mais ambicioso, mas só com o fiasco de SimCity que a distribuidora deles, Paradox Interactive, se motivou a financiar esse projeto - o gigante do gênero já não assustava mais. A boa interação com a mídia de jogos, seja através de sites especializados ou canais em redes como Twitch e YouTube, garantiu o hype que eles precisavam, e o sucesso foi inevitável.

Após 26 horas de jogo ainda estou na minha primeira cidade: a pequena Wololópolis, com pouco mais de 32 mil habitantes. Jogos como esse te permitem saboreá-los sem pressa e fazer experimentações. Aliás, o principal problema dele é ser estranhamente fácil - uma cidade minimamente bem-planejada tem um orçamento sempre no verde, e após algumas horas dinheiro deixa de ser um problema. Existem muitas possibilidades por trás disso: o jogo esta desbalanceado? Nossos prefeitos da vida real são muito incompetentes? Sobra dinheiro porque você não precisa superfaturar contratos de doadores de campanha, já que seu cargo é vitalício? Talvez nunca saberemos.

E mesmo este, o grande ponto fraco para aqueles já versados no gênero e acostumados à dificuldade do agora veterano SimCity 4 (principalmente pré-expansão), deve ter algum mod para remediar. Enquanto isso, a minha cidade segue aumentando aos poucos…

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